Uma terceirizada e a empresa que contratou o seu serviço foram condenadas por litigância de má-fé porque não quiseram propor acordo a um empregado em uma ação sobre pagamento de verbas rescisórias. As companhias terão de pagar multa de 2% sobre o valor corrigido da causa e indenização ao trabalhador.
O juiz Everton Luiz Mazzochi, da 2ª Vara do Trabalho de São Paulo, julgou o caso com base na reforma trabalhista — Lei 13.567, de 2017, em vigor desde novembro. Pesou na decisão do magistrado, segundo consta na sentença, o fato de não haver dúvidas, no processo, que o ex-funcionário não recebeu as verbas rescisórias.
Por esse motivo, afirma o juiz na decisão, a atitude de “sequer tentarem” a conciliação se enquadra no artigo 793-B da nova lei — que trata sobre litigância de má-fé. E com base no 793-C, o magistrado estabeleceu a multa de 2% e a indenização.
A decisão é polêmica. Especialmente porque, segundo advogados, para que haja a conciliação — ou uma tentativa — as partes têm que estar dispostas. Não há no ordenamento jurídico brasileiro, acrescentam, punição para quem se recusa a propor um acordo. O caso julgado pela 2ª Vara de São Paulo, afirmam especialistas, é o primeiro que se tem notícias nesse sentido.
Até a reforma trabalhista não havia, na CLT, um regramento específico para a litigância de má-fé. Os juízes, quando aplicavam, utilizavam-se do Código de Processo Civil (CPC). “Mas era pouco usada” lembra Daniela Yuassa, sócia do Stocche Forbes Advogados. “Víamos mais nos casos de recurso protelatório. O sujeito sabia que ia perder e mesmo sem motivo para recorrer entrava com recurso”, acrescenta.
Com a reforma foram introduzidos na legislação trabalhista os artigos 793-A, B, C e D. Há uma lista das hipóteses em que se pode condenar por litigância de má-fé. Entre elas, defesa contra fato incontroverso, resistência injustificada ao andamento do processo e o recurso protelatório. O 793-C permite ao juiz impor multa — superior a 1% e inferior a 10% do valor corrigido da causa — e indenização.
No caso julgado pela 2ª Vara de São Paulo (processo nª 1002187-83.2017.5.02.0002), a empresa terceirizada reconheceu na audiência que não havia pago as verbas rescisórias ao ex-funcionário e argumentou que não o fez por dificuldade financeira. Esse seria o fato incontroverso, que, no entendimento do juiz, justificaria a condenação.
Já a tomadora do serviço, ainda segundo a decisão do magistrado, responderia de forma solidária à dívida. E, sabendo do inadimplemento, deveria ter tentado acordo com o trabalhador.
Representante da empresa que terceirizou o serviço, o advogado Aldo Martinez Neto, do Santos Neto Advogados, diz que para esses casos, de empregadores que reconhecem a dívida em juízo, existe multa prevista pelo artigo 467 e o juiz, acrescenta, poderia ter aplicado o dispositivo. O que não poderia, na visão do advogado, é forçar a tomadora do serviço a propor um acordo com o trabalhador.
“A empresa estava se defendendo da existência ou não da responsabilidade subsidiária e não das verbas em si”, argumenta o advogado. “E, além disso, por que a segunda reclamada faria um acordo se a primeira reclamada pode ser condenada e pagar? Não faz sentido”, acrescenta Martinez Neto.
O advogado diz ainda que todos os artigos da CLT que tratam sobre conciliação deixam claro que a composição depende da vontade das partes. “Não há nenhum dispositivo estabelecendo que as partes que não conciliam, mesmo diante de uma situação incontroversa, estejam litigando de má-fé.”
Na Justiça do Trabalho, diz Alexandre Pessoa, do escritório KLA Advogados, a conciliação tem uma importância muito grande. “Tanto que o nome original da vara do trabalho era junta de conciliação e julgamento. Os juízes, geralmente, já abrem a audiência perguntando se há possibilidade de acordo”, diz o advogado. “Então a má vontade das partes em negociar pode acabar atrapalhando o processo”, complementa.
Para ele, no caso julgado pela 2ª Vara, no entanto, tem que se avaliar “o todo”. “A terceirizada não pagou a rescisão, confessou a dívida em juízo e mesmo assim não fez o pagamento e sequer tentou um acordo com o trabalhador. Não me parece que o juiz tenha condenado por litigância de má-fé só porque não propôs o acordo e sim porque, além de tudo o que aconteceu, ela não tentou o acordo”, acrescenta.
Não só os empregadores que vêm sendo condenados por litigância de má-fé. Os trabalhadores, após a reforma, também passaram a ser punidos com mais frequência pelos juízes. “Eu diria que com mais recorrência até do que as empresas”, diz Daniela Yuassa, do Stocche Forbes Advogados. Ela cita como exemplo casos de trabalhadores que acionam o Judiciário para cobrar verbas rescisórias já recebidas.
Foi o caso de um ex-funcionário de uma terceirizada que prestava serviços de limpeza para condomínios. A juíza Ana Cristina Magalhães Fontes Guedes, da 28ª Vara do Trabalho de São Paulo, não só o condenou por litigância de má-fé, determinando o pagamento de multa de 2% sobre o valor da causa e indenização, como também revogou o benefício da justiça gratuita (processo nº 1000202-64.2018.5.02.0028).
Há caso ainda de condenação a trabalhadores que mentiram nos processos. Em um deles, julgado recentemente pela 1ª Vara do Trabalho de Diadema (processo n 1000837-59.2017.5.02.0261), um homem foi condenado a pagar R$ 20 mil porque pedia o reconhecimento de vínculo empregatício — alegando que havia trabalhado de forma informal por dois anos — quando na verdade era sócio da empresa.
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